terça-feira, 19 de setembro de 2017

Entrevista: Ricardo Dias (For The Glory)

Ao fim de 14 anos de banda, os For The Glory regressam às edições com "Now And Forever", o quinto álbum da banda. Dia 22 de setembro é a data de lançamento oficial deste CD Digipack editado pela Rastilho Records com o pontapé de saída a ser dado em Lisboa, no Musicbox. Depois disso há datas por todo o país para vos dar a conhecer este registo, já disponível na íntegra para escuta no bandcamp da editora. Eu e o David enviámos algumas questões rápidas ao Ricardo Dias aka Congas aka o verdadeiro Maradona do Bairro da Mealhada sobre este novo disco e sobre a longevidade dos For The Glory. Em baixo as respostas.


Fala-nos um pouco deste novo disco que marca os regresso dos For The Glory às edições, quatro anos depois do Lisbon Blues. Nesse disco encontrávamos uma forte marca do momento pelo qual o país passava, num contexto de crise em que se queria ver a malta alerta e ativa relativamente aos problemas que nos afetavam, e em que a música servia como veículo dessa mensagem de luta e perseverança. Já com outro contexto político-social (ainda que muitas das coisas não tenham mudado assim tanto...) surge este Now And Forever. Qual é a principal mensagem que querem transmitir com este disco?

Tudo o que disseste é o espelho perfeito do contexto em que o Lisbon Blues foi idealizado e também realizado. Felizmente houve algumas melhorias no sentido de que o fantasma da crise desapareceu, apesar de continuar a haver desemprego a monte, de cada vez mais as pessoas se afundarem na escuridão da sua mente e deixarem os fantasmas da depressão tomarem conta da sua vida. Infelizmente continuamos a viver tempos de crispação social e tempos conturbados onde o preconceito, xenofobia e medo da diferença revela um país que afinal tem um lado mais preconceituoso adormecido.

O Now And Forever tem um sabor diferente, por assim dizer. Tem um feeling mais de olhar de retrospectiva, de pensar o passado, viver o futuro e dando o statement de "para sempre". A verdade é que passaram 14 anos desde o primeiro concerto, a verdade é que cresci com esta banda, e esta banda esteve comigo em todas as grandes decisões e transições da minha vida. Como que se ela fosse a banda sonora da minha vida, portanto posso legitimamente dizer que se esta banda não acabou durante estes anos, já é para sempre.

Nos últimos anos têm havido algumas mudanças na formação de FTG. Como é que isso afectou a escrita do novo disco? Há diferenças na dinâmica da banda?

É um facto que temos tido algumas mudanças na formação de FTG. A dinâmica de banda continua a ser a mesma, porque as pessoas que foram entrando são pessoas que já conheciam a banda há muito tempo ou  são pessoas com as quais já partilhávamos algo e que sua adaptação foi fácil. A última entrada foi do Afonso para o lugar que o Sérgio deixou, e a sua entrada foi depois deste disco estar gravado, pelo que não se nota nada na forma de escrever. A base de escrever riffs foi a mesma, tirando o facto de todos as músicas terem sido escritas apenas com uma guitarra. No entanto na altura de fazer malhas, todos nós contribuímos com ideias, seja nos riffs ou nas estruturas dos temas.

Quais são as maiores fontes de força e motivação para manterem a banda ativa e para ainda tocarem hardcore passados todos estes anos?

A vontade de dizer algo, a vontade de partilhar a música que há dentro de nós, partilhar ideias, conhecer pessoas, viajar e tudo isso. Todas essas coisas fazem-nos acreditar que ainda faz sentido.
Enquanto houver quem acredita nesta banda e no que fazemos, então faz sentido continuar a existir. Obviamente que daqui a uns anos talvez o nosso corpo já não aguente o choque da energia dos concertos, mas até lá vamos continuando a fazer o que nos diverte.

Eu consumo muita música diferente, e não vou negar que também já tive, e tenho, vontade de experimentar fazer algo diferente, mas como disse acima esta é uma banda que me acompanha há 14 anos, que me levou a locais onde nunca pensei ir, que me fez sentir coisas que nunca tinha sentido, portanto é com ela que neste momento tenciono ficar por mais um par de anos e atingir alguns objectivos que ainda não atingimos.

Falaste em objetivos ainda por atingir com FTG. Há algo que possas partilhar sobre o que ainda figura na tua bucket list?

Há coisas que ainda gostava de fazer. Adorava fazer esses festivais maiores da europa. Gostava imenso de conseguir fazer tour na Ásia e no Brasil. Nos USA não é uma coisa que me cative por aí além, mas esses dois continentes era bom demais!


Nos últimos anos temos vindo a assistir a uma mudança de paradigma no que diz respeito aos concertos de For The Glory, quer em Portugal quer lá fora. Se cá cada vez mais são nome habitual em festivais de metal, também lá fora as tours de vários dias foram trocadas por datas únicas ou fins de semana com dois/três concertos. Sei que não é novidade para ti falares desta relação cada vez mais próxima com a cena do metal, mas recorda-nos um pouco como é que esta aproximação aconteceu e como é que comparas estes dois géneros musicais e cenas distintas, mas com vários pontos em que se tocam.

Respondendo à troca de datas soltas pela Europa em detrimento das tours, foi uma situação à qual fomos "forçados" pelas melhores razões. Há 2 anos e meio fui Pai pela primeira vez e a minha presença era necessária em casa. Já tenho um trabalho que me obriga a passar alguns dias fora e fazer estrada a um nível nacional, e a ideia de me ausentar de casa durante 3 semanas ao início assustava-me imenso.

Agora já vamos conseguir marcar uma ou outra tour, tentar fazer à mesma esses weekend trips e tentar fazer o máximo que nos for possível. FTG não é um trabalho e não sentimos que somos obrigados a fazer só porque sim, só fazemos as coisas quando realmente as queremos. Isso é algo que não irá mudar.

Em relação a sermos presença em festivais de metal, acho super fixe. Na realidade não vejo grandes diferenças de algumas bandas de metal para a nossa, na forma de trabalhar, na forma diy com que gerem a banda, na forma como abordam questões sociais, etc. De há uns anos para cá temos feito algumas datas com uma banda de amigos que são os Switchtense. Eles tocam um thrash metal rápido, incisivo com umas letras boas e com grande onda. Quando nos conhecemos foi tipo aquela empatia mega cool. Percebemos que não havia grandes diferenças na forma de estar de ambas as bandas e simplesmente houve o click. Depois acho que o facto de me dar bem com muita gente acaba por gerar esses convites e acaba por levar a uma maior aceitação nos festa de metal. Acabamos muitas vezes os concertos com pessoal a dizer "não gosto de hardcore, mas vocês ao vivo são diferentes". Isso é bom de se ouvir, é bom perceber que há uma abertura maior ao nosso tipo de banda.

Infelizmente, não posso dizer o mesmo ao contrário. O pessoal do core continua a ser um bocado preconceituoso em relação a algumas bandas de metal. Tanto me vês num concerto de hardcore como num de metal, de punk rock ou whatever. Se gostar da música, das bandas e das pessoas, tenho todo o prazer em marcar presença. Não tenho vergonha de o mostrar. No HC vive-se sempre a apregoar a aceitação da diferença, mas não conseguimos aceitar as diferenças entre metal e hardcore...parece-me redutor e parvo.

Foi difícil sair da zona de conforto dos concertos "pequenos" mas em que todos se conheciam (e vos conheciam) e começar a tocar para malta que, provavelmente, não fazia ideia de quem eram e dos anos que já tinham nas pernas?

Encaramos todos os concertos com a mesma disposição. Vamos lá passar um bom bocado. Há muitos anos que nos deixámos de levar tão a sério. Continuamos a fazer o melhor que sabemos, continuamos a tocar o melhor que conseguimos e a tentar ser "profissionais", mas sempre na descontra. Adoro tocar para 500 ou 600 da mesma forma que adoro tocar para 50. São formas de encarar a coisa diferentes e em que temos de dar sempre o máximo.

Cada vez que vamos ao estrangeiro é um começar de novo constante. Não somos banda local, somos a banda de fora e tocamos sempre para pessoas diferentes, porque todos os anos há renovação das pessoas que vão a concertos. Todos os anos apanhamos sempre pessoas novas a dizer que é a primeira vez que nos vêm. Isso é estimulante!

E quanto a tocar lá fora? Acredito que voos low cost sejam uma ajuda importante para a internacionalização da banda.

O aparecimento de empresas low cost facilita a ida lá fora quando tens o teu gear lá. Se tiveres de levar guitarras e mais merch, etc, acaba por não ser assim tão benéfico. Claro que se tiveres alguma banda amiga que te empresta quase tudo, então é uma boa solução. Temos feito algumas incursões lá fora e vamos de low cost ou de companhias regulares dependendo da situação e com quem tocamos.

Este novo registo conta já com três vídeos online a promoverem precisamente três das onze faixas. Como e porque é que surgiu esta maior aposta no audiovisual para comunicar a vossa música?

Sempre quisemos fazer vídeos para os outros discos, mas o que acontecia é que ou passava o timing ou não estávamos com paciência para os gravar. Sempre fomos meio desligados com essa coisa dos vídeos.

Agora tivemos aquela pressão do Vynn de Steal Your Crown, que nos melgou para gravarmos uns videos e que queria gravar um ou dois vídeos com a banda. Entretanto quando tocámos no Casainhos Fest ele acabou por retirar mais umas imagens e apareceu com um vídeo novo, hahah. Portanto foi mesmo preciso ter um gajo como o Vynn a chatear e não pensarmos muito para fazer isso acontecer.
Agradecemos imenso ao Vynn porque conseguiu fazer três vídeos que gostamos imenso!

Portugal e especialmente a cena hardcore sempre foi um mercado bastante curto para a venda de discos e isto obviamente tem o seu impacto nas formas de subsistência de uma banda. Qual a tua opinião sobre o Spotify e todas essas novas plataformas de streaming na sua relação com as bandas quer no que diz respeito à divulgação quer também à parte financeira.

Tudo o que são plataformas digitais estão a cargo da nossa editora. Não trabalhamos o digital. A nossa venda de discos costuma correr bem, claro que não são números astronómicos mas estamos bem com isso. Obviamente que era importante conseguir vender discos, essa é a única forma de bandas como a nossa subsistirem.

Também para as editoras conseguirem editar as bandas é preciso haver vendas de discos. Editoras como a Rastilho, Hell Xis, a Infected, a Raging Planet, a Mosher Records etc, são editoras feitas por pessoas que são fãs de música, que gostam de apoiar e lançar novas bandas, mas para essas editoras conseguirem meter os discos cá fora, eles têm de ser comprados. Não peço para comprarem discos por piedade, mas se gostam das bandas é de valor o vosso apoio ao comprar o cd.


Em 14 anos muita coisa muda. Tentando não cair muito na pergunta cliché, há algo que gostasses de desenterrar do passado para aplicar ao presente? E algum arrependimento?

Não me arrependendo de muitas coisas, há algumas coisas que rectificava no plano pessoal. Enquanto banda, acho que temos o caminho que estava destinado. Temos a consciência tranquila do que fazemos e onde queremos estar, o que queremos fazer. Gostava de regravar o Down In Blood e lançar o Survival Of The Fittest em LP, hahaha.

Com este novo disco na bagagem deduzo que o plano a curto prazo seja tocar sempre que possível. Há algo já planeado? Shows lá fora, aquele vinil para os colecionadores, tours?

Temos várias datas marcadas, vamos andar por Lisboa (22 set), Caldas da Rainha (29 set), Porto (30 set), Pinhal Novo (6 Out), Faro (7 out), Figueira da Foz (27 out), Viana do Castelo (28 out).

Temos também uma tour europeia agendada com cerca de 13 datas e já estamos a fechar datas para 2018. No que toca a concertos, somos uma banda que até toca com alguma frequência e não nos podemos queixar.

Últimas palavras.

Primeiro de tudo gostava de vos agradecer por nos darem espaço de partilhar um pouco sobre a banda, e deixar o convite a todas as pessoas que estejam interessadas em passar no Musicbox na sexta feira dia 22 setembro de 2017 para release show de Now And Forever. Era fixe ver toda a malta que tem acompanhado a banda ao longo dos anos por lá. Um abraço enorme.

Sem comentários:

Enviar um comentário